Conecte-se faz parte do Mastur Bar. O Mastur Bar é uma coisa bem complexa, mas é um bar. Faço uma performance que se chama aula-show, sobre o gesto desmunhecar. Gosto de investigar a corpa, notar como se movem as articulações, o que isso tem a ver com nossa ancentralidade cobra, o que tem a ver com os processos coloniais, e criar imagens que movem esse fluxo para outra direção. Na aula-show mostro, com palavras, músicas, imagens e objetos, como esse gesto foi construído como sendo um gesto do repertório feminino branco burguês e depois virou “ser um homem afeminado”. Munheca vem do espanhol, é boneca. A língua do colonizador dando nome pra uma parte do corpo. Eu vou contando a historia – ficção desse gesto com imagens da história da arte canônica a partir do século XVI até chegar nas imagens em que desmunhecar vira um gesto feminino (antes era apenas um gesto nobre). Isso acontece no final do século XVIII, quando aparece nas corpas das mulheres denominadas histéricas pelo diretor do Hospital Psiquiátrico Salpetriere, Charchot, que criou toda uma iconografia para coreografar a histeria como doença exclusivamente feminina. O orgasmo em condições clínicas “curava” as pacientes (sendo masturbada pelo médico). A desmunhecada estava em contratura (gesto que parece um soco pra dentro), bem longe do ventre. A revista Vogue, que surgiu no início do século XIV, depois dessa iconografia, sempre tinha uma mulher desmunhecando na capa.
Daí chego na dança Vogue, que surgiu em Nova York, no Harlem, nos anos 60, sendo criada por corpas dissidentes de raça, classe e gênero, que subvertem o gesto. Misturado com o break dance, com a ginastica e outras danças afro-hispânicas, desmunhecar vira outra coisa, vira a afirmação de uma potência, questiona o que é ser “mulher”.
A imagem do conecte-se, que tem um wifi buceta-cu, surge nessa pesquisa e também depois de algumas sessões de acupuntura que fiz e senti um alinhamento dos chakras. Ela se materializa quando olho pro símbolo do wifi e vejo um triângulo que é a representação de como a vibração se propaga na água. Nessa parte da performance falo sobre o capitalismo touchscreen, mais uma apropriação da vibração. Assim como os vibradores foram criados para curar a histeria, o celular quer concentrar nosso desejo todo nele, e umas das técnicas é a vibração. O toque sensível à tela, esse tipo de espelho que rola, é o feed. Como um cachorro que quer esconder o cocô e esfrega a pata no piso frio achando que ali tem terra, estamos sempre buscando TUDO no feed.
O conecte-se é sobre a conexão de si, o cuidado de si, a masturbação como gesto de cura e produção de vibração que começa no chakra básico e vai ate o coronário. É uma forma de visualizar e ao mesmo tempo apagar esse aprendizado colonial sobre o amor romântico, sobre a educação pela pornografia mainstream, sobre a desconexão entre sexo e espiritualidade.
Comecei o Mastur Bar em 2015 e desde então muitas pessoas colaboraram com o projeto e ele foi tomando outras formas. Me sinto mais próxima do conecte-se. Tenho feito praticas de gozar sem objeto, pensar as fronteiras entre o riso, o gozo e o choro, acupuntura. Não sei se faria diferente. Talvez não. Vejo o trabalho como um pequeno arquivo que agora me leva para os ossos, além dos gestos. Tenho pensando na relação entre pélvis e esfenoide, o osso que faz a mandíbula se mexer, dentre outras coisas. É o primeiro osso que surge na base do crânio e tem o mesmo formato borboleta da pélvis. Tenho pensando assim: uma boca virada pra terra e bem diferente da boca pra frente. Gosto de ler imagens e continuo lendo. Mas tem uma coisa que é produzir imagens, acho que me localizo mais na produção de imagens como se fossem um oráculo. Assim fico mais a vontade pra diferenciar intuição, paranóia e desejo.
Oracular-se
Desejo
bell hooks: O amor como a prática da liberdade
Magia
Solange, tô aberta
Irmã
Kundaline
Plexo Solar
Maria Galindo: No se puede descolonizar sin despatriarcalizar
Artista-pesquisadora, trabalha na intersecção entre arte, produção de subjetividade e invenção de pedagogias. Doutora em Arte e Cultura Contemporânea pela UERJ com a tese Lady Incentivo SEX 2018: um disco sobre tese, amor e dinheiro. Em 2017 participou da residência Capacete – Documenta 14, Atenas, Grécia e em 2018 da 10ª Berlin Biennale.
Fabiana Faleiros
Como se deu a materialização do trabalho?
Conecte-se faz parte do Mastur Bar. O Mastur Bar é uma coisa bem complexa, mas é um bar. Faço uma performance que se chama aula-show, sobre o gesto desmunhecar. Gosto de investigar a corpa, notar como se movem as articulações, o que isso tem a ver com nossa ancentralidade cobra, o que tem a ver com os processos coloniais, e criar imagens que movem esse fluxo para outra direção. Na aula-show mostro, com palavras, músicas, imagens e objetos, como esse gesto foi construído como sendo um gesto do repertório feminino branco burguês e depois virou “ser um homem afeminado”. Munheca vem do espanhol, é boneca. A língua do colonizador dando nome pra uma parte do corpo. Eu vou contando a historia – ficção desse gesto com imagens da história da arte canônica a partir do século XVI até chegar nas imagens em que desmunhecar vira um gesto feminino (antes era apenas um gesto nobre). Isso acontece no final do século XVIII, quando aparece nas corpas das mulheres denominadas histéricas pelo diretor do Hospital Psiquiátrico Salpetriere, Charchot, que criou toda uma iconografia para coreografar a histeria como doença exclusivamente feminina. O orgasmo em condições clínicas “curava” as pacientes (sendo masturbada pelo médico). A desmunhecada estava em contratura (gesto que parece um soco pra dentro), bem longe do ventre. A revista Vogue, que surgiu no início do século XIV, depois dessa iconografia, sempre tinha uma mulher desmunhecando na capa.
Daí chego na dança Vogue, que surgiu em Nova York, no Harlem, nos anos 60, sendo criada por corpas dissidentes de raça, classe e gênero, que subvertem o gesto. Misturado com o break dance, com a ginastica e outras danças afro-hispânicas, desmunhecar vira outra coisa, vira a afirmação de uma potência, questiona o que é ser “mulher”.
A imagem do conecte-se, que tem um wifi buceta-cu, surge nessa pesquisa e também depois de algumas sessões de acupuntura que fiz e senti um alinhamento dos chakras. Ela se materializa quando olho pro símbolo do wifi e vejo um triângulo que é a representação de como a vibração se propaga na água. Nessa parte da performance falo sobre o capitalismo touchscreen, mais uma apropriação da vibração. Assim como os vibradores foram criados para curar a histeria, o celular quer concentrar nosso desejo todo nele, e umas das técnicas é a vibração. O toque sensível à tela, esse tipo de espelho que rola, é o feed. Como um cachorro que quer esconder o cocô e esfrega a pata no piso frio achando que ali tem terra, estamos sempre buscando TUDO no feed.
O conecte-se é sobre a conexão de si, o cuidado de si, a masturbação como gesto de cura e produção de vibração que começa no chakra básico e vai ate o coronário. É uma forma de visualizar e ao mesmo tempo apagar esse aprendizado colonial sobre o amor romântico, sobre a educação pela pornografia mainstream, sobre a desconexão entre sexo e espiritualidade.
Como você vê seu trabalho hoje?
Comecei o Mastur Bar em 2015 e desde então muitas pessoas colaboraram com o projeto e ele foi tomando outras formas. Me sinto mais próxima do conecte-se. Tenho feito praticas de gozar sem objeto, pensar as fronteiras entre o riso, o gozo e o choro, acupuntura. Não sei se faria diferente. Talvez não. Vejo o trabalho como um pequeno arquivo que agora me leva para os ossos, além dos gestos. Tenho pensando na relação entre pélvis e esfenoide, o osso que faz a mandíbula se mexer, dentre outras coisas. É o primeiro osso que surge na base do crânio e tem o mesmo formato borboleta da pélvis. Tenho pensando assim: uma boca virada pra terra e bem diferente da boca pra frente. Gosto de ler imagens e continuo lendo. Mas tem uma coisa que é produzir imagens, acho que me localizo mais na produção de imagens como se fossem um oráculo. Assim fico mais a vontade pra diferenciar intuição, paranóia e desejo.
Que palavras conectam, colocam seu trabalho em relação com práticas, corpos, textos?
Oracular-se
Desejo
bell hooks: O amor como a prática da liberdade
Magia
Solange, tô aberta
Irmã
Kundaline
Plexo Solar
Maria Galindo: No se puede descolonizar sin despatriarcalizar
Bio: Artista-pesquisadora, trabalha na intersecção entre arte, produção de subjetividade e invenção de pedagogias. Doutora em Arte e Cultura Contemporânea pela UERJ com a tese Lady Incentivo SEX 2018: um disco sobre tese, amor e dinheiro. Em 2017 participou da residência Capacete – Documenta 14, Atenas, Grécia e em 2018 da 10ª Berlin Biennale.